quarta-feira, 22 de abril de 2009

Aqui era o título


O Homem que se senta sozinho à mesa não se senta à mesa e não está sozinho. A mesa é que estava a ser apenas móvel. Agora que o homem sozinho decidiu sentar-se à mesa, a mesa é parte dessa multidão que o homem carrega. Porque um homem sozinho é sempre muito mais gente do que um homem com outro homem. E uma mesa com um homem só fica invariavelmente mais povoada do que uma mesa com duas pessoas, ou com uma família a jantar.
Uma família a jantar, ou duas pessoas sentadas a uma mesa têm-se unicamente uma à outra ou têm-se entre si. E o incómodo que é terem-se num mesmo tempo e num mesmo espaço não lhes permite o peso (ou o conforto) de carregarem outras pessoas.
Pode parecer este universo complicado. Pode parecer este discurso tonto. Mas o homem que opta por se sentar sempre sozinho à mesa, a uma mesa qualquer, é um homem mais povoado do que todos os homens (e algumas mulheres) que se sentam à mesa uns com os outros, uns ao lado dos outros, ou até frente a frente.
Eu, por exemplo, sou uma mulher sentada sozinha à mesa e, podem ir à roda do mundo perguntar, e (querendo!) ficam a saber que, embora solitária, eu sou a mulher menos sozinha de todas as mulheres com quem já falei ou apenas privei com um olhar de longe (porque se priva muito com um olhar longínquo, contando que esse olhar não seja distante).
Antes de abrir este guardanapo de papel para escrever, eu era apenas um ser humano sozinho num bar. Depois (agora) sou todos os olhares que se esquecem de quem está frente a frente ou lado a lado, e se põem a querer ser, como eu, homens e mulheres sozinhos sentados à mesa. E quando esta pequena, mas sugestiva reflexão terminar, suspeito que deixarei de ser uma mulher sozinha à mesa, e passarei a ser uma mesa vazia a olhar-me de frente.

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